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terça-feira, 10 de agosto de 2010

Entrevista com Anton Corbijn para o jornal português Expresso - Novembro/2004

Publicada no fórum U2 Ultraviolet ( www.ultraviolet-u2.com )

Fotografias com música

Anton Corbijn é o fotógrafo principal do U2 desde 1982. Iniciou a sua carreira na Holanda, de onde é natural, tirando fotografias em concertos de jazz. Em 1979 partiu para Inglaterra e foi bater à porta da 'New Musical Express'. O primeiro trabalho que lhe deram foi fotografar Bill Haley. Saiu-se bem e nunca mais parou. As capas que fez para a revista não têm conta. Aí trabalhou até 1985. Depois saiu para a estrada e fotografou nomes tão importantes como Depeche Mode, Rolling Stones, David Bowie, Nirvana, Police, Sex Pistols, Johnny Cash, Nick Cave, Tom Waits e R.E.M.

Dedicou-se também ao vídeo e tem surpreendido tudo e todos com a sua
criatividade. Está terminando um livro sobre o U2 e é sobre a banda irlandesa que fala ao Expresso, depois de os ter trazido a Portugal para várias sessões fotográficas para How to Dismantle an Atomic Bomb, o 11º álbum do U2.

Por que escolheu fotografar músicos e bandas de rock? Foi uma opção?

Porque adoro música. Comecei por fotografar músicos vindos do jazz e dos blues, depois músicos da pop e do rock. Quando era novo preferia a música à fotografia. Fotografar quem fazia música era uma espécie de extensão natural do meu interesse musical. Havia uma série de músicos de quem eu gostava. Descobri uma máquina fotográfica e a combinação pareceu-me óbvia.

O que é que faz de um profissional um bom fotógrafo?

Não faço ideia. Não sei. É difícil para mim pensar nisso.


Mas quando está a fotografar, o que é que procura? Segue a sua intuição?

Estou sempre à procura que a câmera descubra algo que, de qualquer forma, me diga qualquer coisa, algo agradável à vista, ou outra coisa do género. Há imensas coisas que procuro. Posso fazê-lo a nível estético, como o posso fazer a nível de conteúdo.

Porque é que escolheu Portugal para fazer várias sessões de fotografia com
o U2?


Porque os consegui arrastar comigo.

Conhece Portugal bem?

Razoavelmente. Já aí estive bastantes vezes. Fui a primeira vez nos anos 80 para fotografar algumas pessoas e fazer um vídeo. Depois fiz uma série de vídeos com o Depeche Mode para Enjoy the Silence, metade filmados aí, metade em Inglaterra. Fiz aí um outro vídeo para um grupo alemão, The Rain Birds. E muitas vezes, no Inverno, na Inglaterra está muito frio e prefiro fotografar em locais um pouco mais quentes. Agrada-me Portugal e gosto das pessoas também. Portugal é um bom lugar para filmar em termos de ambiente. Também trabalhei com um produtor inglês, Nicholas Cave, que morreu há três anos e que tinha um escritório em Portugal.

Foi por isso que trouxe o U2?

Precisávamos fotografar no final de Abril e aqui ainda estava frio. Por outro lado, se fotografássemos em Londres ou em Dublin, seria muito difícil estarmos concentrados. Estamos todos muito habituados às coisas do dia-a-dia, estamos sempre a receber ou a fazer telefonemas, encontramo-nos com outras pessoas. É difícil ter a banda a sentir-se única, a formar um todo. As fotografias pareceriam que cada um deles seria uma pessoa só. É importante sair de Dublin. Eu tinha-lhes dito para viajarmos para algum local que estivesse a duas horas de vôo de Dublin em direção ao sul. Eles escolheram Barcelona, mas eu disse-lhes que achava que Lisboa era melhor. Então vim à procura de lugares, tirei algumas fotografias e mostrei-lhes.
Eles concordaram.

Correram bem as sessões de fotografia?

Foram fantásticas. Escolhi lugares à volta de Lisboa para fotografar, por isso não será óbvio nas fotografias que estamos em Lisboa.

É sua a fotografia da capa do disco?

Sim.

Onde é que foi tirada?

Não quero revelar, foi perto da cidade.

Está preparando o livro 'U2 e eu'. Trata-se apenas de um livro de fotografias
ou também conta algumas histórias?


É um livro de fotografias e não só. Tem mais de 400 páginas e é apresentado como um diário manuscrito. Há textos de outras pessoas, como o do ex-presidente Clinton, por exemplo. E tem uma entrevista extensíssima que fiz com Bono.

De todas as fases em que tem trabalhado com o U2, qual a que prefere?

É difícil dizer porque todas significam coisas diferentes para mim.

E a sua relação com eles também se transformou em amizade...

Sim, acho que sim. Já lá vão mais de 20 anos desde que nos conhecemos...

Acha que tem vindo a desenvolver a imagem do grupo?

Sim, acho.

E sente o poder de fazer isso, sabendo que estamos falando da maior banda
rock do mundo?


É verdade. Mas não é bem o poder que eu sinto, talvez haja mais uma certa satisfação e uma felicidade por as coisas correrem muito bem. The Joshua Tree foi uma ideia minha que resultou lindamente, até mesmo o trabalho colorido de Achtung Baby, ou o Trabant que escolhi para símbolo desse disco. Mas tudo é um trabalho conjunto. O Bono ajuda-me muitas vezes, eu ajudo-o a ele. No fundo, ajudamo-nos ambos a crescer e a desenvolver um melhor trabalho.


O U2 lhe dá liberdade total para fotografar como quiser?

Está perguntando se me deixam levar a minha máquina!? (risos)

Claro que não. Quero saber se pode escolher sempre os locais das sessões fotográficas, as situações a fotografar...

É sempre diferente. Eles esperam que as minhas ideias sejam boas. Se elas não forem boas, claro que eles não as aceitam. Mas às vezes são eles que chegam com ideias que não acho serem assim tão boas. O que fazemos é conversar para chegar à melhor solução.

Bono, The Edge, Adam Clayton e Larry Mullen são bons modelos?

Podem ser se se sentirem bem, como em Portugal. Eles gostaram muito de lá estar. Já tinham tocado em Portugal, mas nunca tinham ficado uma noite sequer em Lisboa. Para eles era tudo novo, o que ajudou muito para os relaxar e fazer com que estivessem concentrados nas sessões fotográficas. Aí foram ótimos modelos.

Como é que descreve o tempo que trabalhou para a «New Musical Express»?

Épico, caótico e cheio de espírito de aprendizagem, ao mesmo tempo que foi uma porta aberta para conhecer pessoas.

Em que está trabalhando agora?

Neste livro dos U2, que já me leva cinco meses de trabalho e nem um dia de férias. Mas tenho feito coisas novas...

Há alguém que gostasse de fotografar e ainda não tenha conseguido?

Certamente. Mas há tanto tempo ainda. Estou agora mais interessado em desenvolver o meu trabalho enquanto fotógrafo. Se olharmos para os livros que fiz nos últimos 15 anos, podemos ver a evolução de uma fotografia muito intuitiva para uma fotografia muito mais conceitual. Fiz um livro de auto-retratos, um livro a partir de fotografias de paparazzi. Não quero ser um fotógrafo que fotografa e revela. Estou interessado em fotografia, mas também gosto de arquitetura, faço vídeos, faço cenografia para o Depeche Mode. Gosto de evoluir. Não gosto de fazer sempre o mesmo. Tenho muitas exposições a acontecer e projetos pessoais. Vou inaugurar uma mostra bastante grande na Bélgica.

O que é que representa uma imagem num mundo que cada vez dá menos
importância às palavras?


É uma luta para encontrar algo que não seja apenas divertimento. Estamos habituados a ter um tempo muito reduzido de concentração e estamos habituados a olhar as fotografias rapidamente, sem fazermos delas uma leitura. É difícil fazer alguma coisa que tenha significado sem tentar chocar as pessoas. É ótimo conseguirmos fazer uma fotografia que fique na memória das pessoas e que lhes diga alguma coisa sem ter que ser sexo ou violência.

Qual é o passo que gostaria de dar a seguir?

Começar a realizar filmes. Já fiz mais de 80 vídeos e estou farto disso. Não sei se voltarei a fazer mais. Fazer filmes é de fato o que me interessa agora.


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