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quarta-feira, 13 de janeiro de 2010

Capítulo 1: O Legítimo Irlandês

Nascido no dia 10 de maio de 1960, no hospital Rotunda, em Dublin, Paul Hewson, era o segundo filho do casal Bobby e Iris Hewson. Antes dele, o casal já tinha o primogênito Norman, com sete anos. Mais do que irlandeses, os pais do jovem Paul eram dublinenses e haviam passado toda sua vida na cidade.Fatos contam que Paul era um chorão de marca maior e que os pais só tinham silêncio quando o pequeno ia para cama, quase desmaiando de tanto berrar. Mas nem dormindo dava silêncio já que tinha uma certa tendência para roncar. Quando acordava e começava a urrar, Norman pegava o caçula para dar umas voltas pelo quarteirão, na tentativa de atenuar o trabalho de sua mãe.
Mesmo mais velho, Paul não cessava de chorar. Preocupada, Iris levou-o para um médico, já desesperada. O médico examinou a criança de dois anos. Não encontrou nada, mas por precaução pediu que a mãe o deixasse no hospital durante uma semana para ser observado. Ao final desse período, Iris foi buscá-lo e soube que nada havia de errado com o garoto. Aliás, havia sim: Paul chorava quando as enfermeiras não davam atenção para ele. Resumindo: era um garoto extremamente mimado. A situação chegou a tal ponto que seu pai só conseguia ler o jornal, após chegar do trabalho, dentro de seu carro, já que silêncio para tal seria impossível com o caçula acordado. Aos três anos, Paul sossegou um pouco e começou a formular suas primeiras frases. Ao invés de berrar passava horas conversando com amigos imaginários no jardim de casa ou mesmo com seu irmão ou com sua mãe. Mas conseguiu pregar bons sustos. Certa vez, seu pai viu o garoto com uma abelha em sua mão e começou a berrar para que Paul se livrasse dela ou poderia ser picado. "Está tudo bem, papai, nós fizemos amizades e estamos apenas conversando", disse o pequeno, com um sorriso no rosto. O pequeno adorava ficar se metendo na vida dos pais, e para conseguirem um pouco de paz, resolveram colocá-lo em uma escola. Matricularam-no na Glasnevin National School, onde começou a viver um dilema. Bobby era católico e Norman tinha sido criado assim. Mas Iris era protestante e pediu que Paul fosse criado sobre sua ótica, o que foi aceito pelo marido. Glasnevin era uma boa escola protestante primária. Nesse tempo, a separação entre as duas religiões na Irlanda estava começando a ficar mais acentuada, mas isso não existia na casa dos Hewson. A melhor amiga de Iris, Onagh Byrne, era católica. Iris e Bobby nunca discutiam sobre religião dentro do lar. Essa proximidade religiosa com a mãe fez de Iris a melhor amiga de seu filho e a única pessoa com quem, de fato, se sentia à vontade. Norman era muito mais velho e seus gostos e amigos totalmente opostos, além de serem completamente distintos em personalidade. Norman era calado, obediente, sério e metódico, enquanto Paul totalmente imprevisível, irônico, desleixado.
Paul não se sentia confortável com as crianças protestantes e isso ficava mais nítido quando ia com Iris aos cultos de domingo. De certa forma se sentia um católico entre todos e acabou aumentando ainda mais sua confusão e causando mais problemas. Aos sete anos, Paul conheceu Derek Rowen e logo viraram grandes amigos. Os dois compartilhavam algumas idéias em comum e possuíam forte independência e personalidade. Derek e Paul adoravam pintar, atividade que faziam na garagem da casa dos Hewson. Mas o auge acontecia quando Clive, irmão mais velho de Derek, pegava os dois e bancava o monitor em aventuras pela vizinhança. Tanta amizade fez que a casa de Derek fosse praticamente seu segundo lar, ainda que fosse pequena e os Rowen tivessem onze filhos.
Paul foi se distanciado de sua família, em especial de seu pai e de seu irmão maior. Norman, nessa época, já tinha um emprego e depois das aulas ia para o trabalho para ajudar nas despesas de casa. Paul era simplesmente visto como o garoto que ainda ia para a escola e que deveria apenas cuidar de seus deveres escolares e não pertubar a mãe durante o dia. Iris sabia que havia essa diferença em casa e tratava de cuidar para que o equilíbrio fosse mantido. Ela tinha uma grande paixão pelos três e era a única que observava e dava atenção para o filho menor. Era Iris quem conversava com Paul, que queria saber dos seus desejos, problemas e frustrações. Aos 11 anos, Paul começou a dar novas dores de cabeça. Ele havia ido para uma nova escola, St. Patrick's Secondary School, o que o desagradou. Paul reclamou para seu pai que queria ir para a mesma instituição em que seu irmão havia estudado. Bobby disse que não seria possível, pois era uma escola muito cara e que Norman tinha conseguido uma bolsa de estudos por sua excelência escolar. E assim foi decidido que ele iria para onde fosse mandado. Mas Paul não era um aluno ruim, pelo contrário. Quando saiu de Glasnevin, era o segundo melhor aluno de sua classe e tinha fama de ser bem comportado, atento, embora um tanto inquieto. O que ele mais gostava realmente eram os passeios que ele fazia pelo parque Griffith, onde ia olhar as garotas e conversar sobre música. Aliás, a única coisa que Paul "aproveitava" de Norman era o seu apurado gosto musical, já que seu irmão tinha em casa discos de Jimi Hendrix, The Who, Rolling Stones e Beatles. Mesmo pequeno, Paul gostava de se juntar aos mais velhos e conversar de "igual para igual" sobre o tema. Paul odiou a nova escola, a postura com a qual tratavam os protestantes. Como tinha um bom porte físico tentou entrar no time de futebol e de rúgbi, mas acabou optando por jogar xadrez e fez seu pai ensinar os rudimentos do jogo. Revelou-se um jogador talentoso e jogando pelo seu bairro, Ballymun, acabou como vice-campeão em um torneio comunitário com jovens de todos os cantos da Irlanda. Acabou entrando em um clube da cidade, o que aumentou mais sua angústia, já que era preciso atravessar a cidade inteira para treinar e não podia ficar mais com seus amigos. E o ódio à escola ainda era o mesmo. O bom aluno virou um péssimo aluno, que cabulava aulas e era displicente. Ele queria sair de lá, mas não sabia como, até ouvir falar de uma instituição nova que estava sendo inaugurada em Dublin, a Mount Temple. A nova escola causou um frisson ao abolir certas normas do país, já que permitiria que católicos e protestantes estudassem juntos, assim como meninos e meninas. Não haveria uma doutrina específica e eles propunham que tanto crianças de lares humildes como dos mais abastados fossem educados da mesma maneira e até que dividissem carteiras. À princípio, Bobby não concordou em matricular Paul na nova escola, mas acabou sendo convencido por Iris e pelo próprio filho. E Paul amou a nova escola, que era completamente diferente das demais e cheia de possibilidades.Em primeiro lugar, não havia uniforme. Também não havia um grande rigor interno e nas aulas era possível debater idéias com os professores. Paul acabou se tornando um aluno brilhante, especialmente em Inglês, História e em Música. Aproveitava para utilizar todo seu charme, inteligência e arsenal de piadas para conquistar colegas e professores. O local preferido dos alunos nos intervalos era um grande corredor da escola, batizado pelos alunos de "The Mall". Lá era o local onde realmente tudo acontecia, ao menos pelos olhos de Paul. Ali estavam as garotas a serem conquistadas, idéias debatidas e principalmente, o local para que pudesse mostrar todas as suas habilidades. Seu melhor amigo era Reggie Manuel, um menino boa pinta, e que namorava uma garota pela qual Paul tinha verdadeira loucura, Zandra. Paul já tinha sua namorada, Cheryl, mas o que queria mesmo era conquistar a namorada do amigo. Uma de suas melhores idéias para isso foi a de inaugurar um local para que todos dançassem. Paul pensou em uma antiga escola e conseguiu que o reverendo Laing, responsável pelo local, desse sua aprovação. Paul era o principal DJ e em breve Zandra abandonou Reggie para ficar com ele, a quem não considerava tão bonito quanto seu ex-namorado e nem tão interessante. Coisas do coração...
Mas logo ele se cansou de Zandra quando viu a nova garota da escola, Maeve, que de cara odiou o menino, por considerá-lo apenas um agitador. Entretanto, Maeve gostou de seus amigos, e tentou usá-lo para entrar naquela turma. A sorte voltou a brilhar para o menino, já que em algumas aulas estudavam na mesma classe e Maeve começou a reparar que Paul era mais brilhante e articulado do que ela imaginava. A amizade dos dois começou a crescer, as conversas aumentavam e os dois se identificavam muito em suas angústias, em suas esperanças. Logo começaram a namorar seriamente.
Com 14 anos e na nova escola, a vida não poderia ser melhor para o jovem Paul.Na escola certa, com a garota certa, e não sentia mais o medo de ser considerado um peixe fora d'água. Nada poderia atrapalhar sua vida. No verão de 1974, seus pais viajaram para Roma, de férias, e Paul foi para um acampamento de verão em Criccieth, Gales, conhecido como "Bee Dees". Paul foi junto com os irmãos Rowen, Derek e Trevor, seus melhores amigos. Lá, começaram a participar dos estudos dominicais na Associação para Jovens Cristãos, o popular YMCA...
O bom do local é que após as lições, poderiam passar o resto do dia nas praias e lá, Paul conheceu uma garota chamada Mandy, na qual teve um típico romance de férias.
Em setembro daquele ano, Iris e Bobby foram participar das comemorações de 50 anos de casamento do pai de Iris. O que era para ser uma grande festa virou uma tragédia familiar de proporções imensas. No dia seguinte, o pai de Iris não acordava e o descobriram morto. Seu corpo foi enterrado e cremado no Cemitério Militar em Blackhorse. A tragédia ficaria ainda maior quando Iris passou mal no local e desmaiou. Levaram-na correndo ao hospital quando descobriram que Iris sofrera um derrame cerebral. O prognóstico não era nada animador, e no dia 10 de setembro, Iris morreu. Paul, que tanto rezara em casa e tinha certeza que não perderia sua melhor amiga, ficou completamente arrasado. No dia do enterro, Paul trancou-se em seu quarto, chorando e tocando seu violão. Como poderia viver com seu pai e seu irmão, pessoas com quem pouco tinha convivência, sem a mãe por perto? Mas não foi só Paul que sentiu a perda. Tanto seu pai como Norman ficaram dias mudos e deixaram as tarefas de casa com Paul, já que os dois trabalhavam. Paul agora tinha que lavar, esfregar, passar aspirador de pó, descobrir como a máquina de lavar funcionava, entre outras coisas. Sua vida, em questão de dias, virara completamente do avesso. O mundo parecia que voltava a conspirar contra ele...

agradecimento: www.beatrix.pro.br/mofo
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