PARA VOCÊ ENCONTRAR O QUE ESTÁ PROCURANDO

sábado, 19 de julho de 2014

Nas gravações de 'Zooropa': descartando a versão de "The Wanderer" com Bono no vocal

Domingo pela manhã na Irlanda, 1993.
Os membros da banda e os produtores chegam e sentam-se na sala do Factory Studios para escutarem pela primeira vez a versão do seu novo álbum. Eles sorriem, eles franzem as sobrancelhas, eles rabiscam anotações.
No final do Lado Um, os experimentos sonoros dão lugar à uma guitarra acústica. A gravação de Bono para "Slow Dancing" registrada por Flood surge nos auto-falantes, surpreendendo Eno, Edge, Larry e Adam, que não sabiam que ele tinha gravado aquilo. "O que vocês acham?", Bono pergunta.
"Eu gosto disso", Eno diz, "mas eu temo que isso seja um grande golpe. Nós temos que cuidar um pouco dela, para de alguma forma prevenir isso."
Bono continua, procurando por aprovação: "Vocês não se importam que ela mude todo o humor do álbum?"
"Slow Dancing" então não deve fazer parte desse corte do disco.
Nem Flood, nem Eno, têm alguma coisa para dizer sobre isso, será a versão de uma música chamada "The Wanderer" que Bono quer usar. Flood tinha colocado a fita com a sua versão preferida, com Bono cantando sua música sobre um homem que dá as costas para sua família e vai embora à procura de Deus no meio terreno e pecaminoso.
A versão com o vocal de Bono para "The Wanderer", os produtores sentiram a peça central do álbum 'Zooropa', uma nova direção para o U2, ainda enraizado no seu passado.
O problema foi que Bono quis usar uma versão da música cantada por Johnny Cash, gravada no próprio Factory, quando o Homem de Preto passou por Dublin duas semanas antes. O argumento sempre foi o mesmo. Eno e Flood sentiam que o crédito da música era ela mesma, e a não ser pela presença da pessoa de Johnny Cash, de ser tão forte e cheio de vívidas associações; para os ouvintes aquela versão tiraria todo o equilíbrio do álbum.
Assim que o barítono ruge, todo o ambiente e a ambiguidade que o U2 havia conquistado, vai embora pela janela. A versão do Bono para a música, em contraste, une todos os outros temas.
Bono argumenta fortemente na outra direção: escutar Johnny Cash cantando sobre uma faixa viajante e distorcida sobre vagabundar em uma terra perdida "sob um céu atômico" é tão bizarro quanto eficaz, e muito mais apropriada para essa música, que é sobre um tipo de personagem de Blood Wise (romance de Flannery O´Connor, de 1952), um peregrino que revela a si mesmo, durante o curso da letra, ser muito mais desarranjado.
Existiam vários méritos em ambos argumentos, mas nenhum dos dois contando a história verdadeira. A real razão pela qual Bono não quis cantar "The Wanderer" (o título é um tiro consciente ao arrogante macho de Dion "The Wanderer") é porque quando Bono a cantava, a música surgia como se fosse sua culpa por todo brilho e fachada que o U2 tinha gastado nos dois últimos anos criando. Quando Bono cantava "The Wanderer", parecia ser uma confissão pública que sob à sombra de The Fly, ele ainda tinha esperanças de encontrar Deus procurando em todo o brilho e lixo.
O personagem da música tinha usado a incitação de Jesus para deixar a sua esposa e mulher e segui-lo como uma desculpa para não cumprir com suas responsabilidades. Ele estava tocando com a heresia antinomiana anciã que você poderia cantar o seu caminho para a salvação ("I went out there in search of experience/ To taste and to touch and to feel as mush as a man can before he repents") ("Eu fui embora à procura de experiências/ Para provar e para tocar e para sentir o máximo que um homem pode antes dele arrepender-se").
Sendo Johnny Cash o cantor da música, Bono ergueu outra face falsa. A porção da audiência que compartilha do seu lado espiritual (assim como a parte que entende o quão sério é a figura do Johnny Cash) iria entender a mensagem profunda, e aqueles que queriam pensar que isso era ridículo, iriam levar um chute para fora do U2 moldando Johnny Cash à Hazel Motes.
Então Flood e Eno podiam argumentar o dia todo o quão divisor é ter Cash, chegando tão fortemente ao final do mais europeu, mais inovador, mais sistematicamente desorientado álbum do U2. Eles não ganharam essa. Bono tinha outros planos."

Do livro 'U2 At The End Of The World', de Bill Flanagan

Agradecimento pela tradução: Fórum UV Brasil (Ultraviolet Fã Clube)
Comentários
0 Comentários

Nenhum comentário:

Related Posts Plugin for WordPress, Blogger...