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sábado, 7 de outubro de 2023

A verdade (na versão de Bono) sobre a saída de Paul McGuinness da administração do U2 - Parte I


Da autobiografia de Bono, 'Surrender: 40 Songs, One Story':

ADEUS AO NOSSO QUINTO BEATLE

Pelo menos durante a maior parte da minha vida adulta tive Paul McGuinness tentando me controlar. Odeio despedidas.
Paul McGuinness se tornou um personagem interessante ao longo dos anos. Uma presença extraordinária, extraordinariamente apresentada.
Sempre vestido com elegância e capaz de tornar elegantes todas as situações, mesmo as que não eram. Camisas e gravatas sob medida da Turnbull & Asser, da Jermyn Street, ternos sob medida de Edward Sexton ou Paul Smith, e o leve rastro de um perfume japonês caro por onde passava. Apenas o suficiente. 
Se estivesse de ressaca, Paul a encarava com um banho escaldante e um barbear perfeito. E nas reuniões matinais, você jamais imaginaria que ele havia tido uma noite intensa, tramando e negociando em seu nome.
Embora, se a noite tivesse sido particularmente intensa, talvez os pedacinhos de lenço de papel grudados nos cortes de lâmina denunciassem uma carnificina. 
Paul tem um quê de velho mundo, um homem preparado com esmero - pela mãe, professora, e pelo pai, natural de Liverpool e piloto de bombardeiro da Força Aérea Real - para levar a vida como um cavalheiro. 
Paul vive intensamente e é naturalmente generoso, mas só até o momento em que suspeitar que você o traiu. Quando então um leve brilho nos olhos denuncia o rancor que ele irá guardar de você.
Na sede da Principle Management, no Sir John Rogerson's Quay, às margens do Liffey, observo a nova e elegante Dublin que Paul, com pequenas, mas significativas contribuições, ajudou a construir. 
Uma cidade moderna, impulsionada por uma política de centro - direita e uma economia de centro-esquerda. Em uma das extremidades de seu escritório com painéis de madeira, uma tela de dois metros de largura de Harry Kernoff, Melodeon Player of the West Ireland, repousando sobre um cavalete antigo. 
Sobre a mesa, a pilha de papéis de entrada um pouco mais alta do que a de saída. Atrás dele, registros de grandes momentos de uma vida grandiosa. Retratos de pessoas importantes. Amigos. Ex-amigos. Alguns retratos de pessoas de quem ele realmente não gostava. Além de momentos e personalidades dos quais ele se orgulhava, uma galeria de pessoas que se desentenderam com ele. Não que ele se desentendesse facilmente, mas se chegasse a esse ponto, Paul não tinha nenhum problema em brigar. Não por ter questões em relação ao abandono ou coisa do tipo. E ele também não dava qualquer desculpa ao recusar um pedido.
"Escrevo para informar que a banda não vai poder participar do seu programa de TV/programa de rádio/sei lá qual evento".
Nem um "Infelizmente estaremos viajando" ou "Estamos ocupados". E não era só Paul que fazia isso. Ele treinou a empresa inteira para não pedir desculpas. Ninguém na Principle Management deveria dar desculpas, exagerar ou mentir em nome dele. Paul era um homem de princípios e também tinha estilo. Se fosse um personagem de ficção, não seria crível, mas, felizmente para nós, esse homem magnífico realmente existiu. E existiu para a nossa banda.
Pois bem, aqui está ele em 2013, sentado atrás daquela mesa, de terno e gravata impecáveis, explicando ao vocalista daquela banda que ele criou desde as fraldas até a adolescência e depois até certo grau de maturidade, que não pode mais acompanhar seus planos de dominação mundial. 
A mais recente era a minha "Teoria do Bloqueio", que seria criar um protocolo de registro, envolvendo todos os gêneros musicais, que nenhum novo formato ou plataforma digital que tentasse vender música a preços artificialmente baixos conseguiria contornar.

PAUL: "Bono, eu simplesmente não tenho tempo, vontade e, no que diz respeito à gestão, muito interesse na próxima grande inovação e nem em expandir a Principle Management".
EU (INTERROMPENDO): "Mas você é a pessoa perfeita pra isso. Todos os outros empresários copiam você. A Principle Management é a líder perfeita. O nome disso devia ser Principle..."
Paul me interrompe.
PAUL: "Você não está ouvindo. Eu teria que querer fazer isso, e eu não quero".
EU (PRESTES A INTERROMPER):
PAUL (INTERROMPENDO MINHA INTERRUPÇÃO): "E posso perguntar quem cuidaria do U2 se eu estiver cuidando de tudo isso?"
EU: "Você, é claro. Você não teria que fazer isso sozinho. E seria mais fácil se houvesse outros empresários para ajudar. Guy Oseary topou falar com Madonna sobre essa novidade. Gosto dele, confio nele. Mais jovem que nós, inovador, entende de tecnologia. 
PAUL: "Será que o Guy Oseary entenderia que é impossível cuidar do U2 usando um BlackBerry? Que administrar vocês quatro não é administrar a Madonna e sim quatro Madonnas? Já estou advogando em nome dos artistas e do destino da indústria fonográfica. Acho que já pensei nisso muito mais do que você. Você ao menos leu o discurso que eu fiz no Midem?" 
EU: "Li. Você me perguntou na semana passada e na semana anterior... e no mês anterior. A bonança on-line: quem está ficando com todo o lucro e por que não estão compartilhando?' Claro que li. Essa conversa aqui sou eu dando continuidade ao debate".
PAUL (OLHOS PARA O CÉU): "Não sou o cara para esse tipo de coisa, Bono. Além disso, a coisa vai se avolumar e você vai querer incluir todos os artistas do mundo. Enfim, eu gosto do funcionamento estelar, ele nos mostra que nem todo mundo pode brilhar. Realmente não tenho energia para isso. Tenho pensado em sair do ramo e voltar para o cinema e para a TV onde comecei. Se é isso que você tem em mente, então talvez seja a hora de eu partir pra outra".

Nós dois paramos para respirar.
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