Revista Rolling Stone - Edição 55 - Abril de 2011
Ao Vivo do Espaço Sideral
Por trás dos segredos da turnê 360º, a maior já feita pelo U2 – e por qualquer outra banda na história - Parte 2
O U2 está tentando fazer arte em estádios de futebol - para alcançar aquilo que Bono chama de "intimidade em larga escala" -, mesmo que, para chegar lá, sejam necessários US$ 750 mil por dia só em custos: palco de 170 toneladas, 200 caminhões e a anulação das emissões de carbono correspondentes, quase 400 pessoas trabalhando na turnê, mais de 250 alto-falantes, 13 câmeras de vídeo e diversos astronautas. A turnê também é a mais recente empreitada na batalha do U2 em provar que a maior banda do mundo também pode ser a melhor - e que, apesar das vendas relativamente fracas de 'No Line On the Horizon', o material novo tem estofo para se colocar ao lado das obras mais antigas. "O que você faz quando está em uma banda?", The Edge pergunta. "Simplesmente abaixa a cabeça e vende um monte de ingressos e CDs no mundo todo? Ou tenta se envolver e fazer alguma coisa diferente?" A banda faz uma última tentativa com "Your Blue Room" e tudo começa a entrar no lugar: ondas de órgão que parece de igreja, os acordes de piano melancólicos de The Edge, holofotes no alto do palco convergindo em uma pirâmide no céu, a imagem final do sol nascendo por cima da Terra, que leva diretamente para "Unknown Caller", com seus versos de abertura que dizem "sunshine, sunshine" (luz do sol). Bono fica aliviado e o ensaio prossegue. "Um passo gigantesco", ele diz, "para um homenzinho."
A caminho de Chicago, o U2 quase esbarrou com Lil Wayne, cinco minutos antes de a banda chegar a um aeroporto particular em Newark, Nova Jersey - estão usando Nova York como base para essa parte da turnê. O jatinho que o U2 está usando hoje é emprestado. Estou sozinho em uma das cabines dele, esperando a decolagem, quando uma silhueta aparece à porta. "Passagem, por favor", diz Bono. Ele está usando calça e jaqueta jeans e óculos escuros cinza, maiores do que seu modelo habitual. O cabelo é brutalmente curto nas laterais - parece que ele apara todos os dias, e deve aparar mesmo. Quando afivela o cinto em um dos assentos, Bono fica fascinado por saber da proximidade de Lil Wayne e dá risada quando o lembram de uma letra do U2 de nove anos atrás: "The last of the rock stars / When hip-hop drove the big cars" [O último rock star / Quando o hip-hop andava com os carrões]. "Nós deveríamos colocar o avião do lado do dele e gritar: era brincadeira!", Bono reflete. A verdade é que Bono - que é amigo de Jay-Z - se relaciona bem mais com o modo de vida de "maior é melhor" do hip-hop mainstream do que com a tendência cada vez maior do rock de se fechar em guetos. "Eu adoro a ideia daquilo que podemos chamar de uma cultura mais porosa, em que há muito mais tráfego circulante", Bono diz. "Nestes tempos de celebridade e estrelato pop, talvez seja prudente questionar os valores de ser um pop star", prossegue. "O Radiohead, o Pearl Jam, muita gente, que talvez fizesse muito mais sentido para nós, rejeitou isso. Mas o que acabou sofrendo com essa atitude foi aquela coisa preciosa e pura, aquilo que costumávamos chamar de 45 [single compacto de vinil em 45 RPM]."
A turnê 360° é o exemplo da ideia do mainstream vital, do poder de um estádio cheio de gente tirando os tampões de ouvido para cantar junto. "Quanto tempo pode durar? Não sei", Bono diz, refletindo sobre a posição cada vez mais única de estrela de sua banda. "A maior parte das pessoas fica contente em seu gueto, e o gueto delas é grande. Eu ainda me apego a essa idéia de metaevento - o que é meta vai além, passa a ser mais do que é." O show é uma fusão improvável dos dois extremos das turnês do U2 - a sobrecarga tecnológica de Zoo TV e o palco sem frescura e despojado da Elevation Tour. "Esta é a nossa obra-prima", diz Williams, que vem planejando a turnê desde 2006, e que acompanha a banda em todas as apresentações para ir ajustando o show de acordo com as necessidades. "É mais ou menos a culminação de tudo que eu fiz com o U2." Não por acaso, o design também significa que, diferentemente de qualquer outra turnê de estádio, todos os assentos disponíveis podem ser preenchidos - e essa é uma das razões por que McGuinness diz que a turnê está a caminho de obter a maior renda bruta de todos os tempos. "Alguém nos perguntou ontem à noite se nós precisamos de tudo isto", diz Clayton. "E a verdade é que ninguém precisa de todas estas coisas. Mas parte do show business é mudar as percepções das pessoas, é encontrar maneiras de fazer com que as músicas emocionem mais as pessoas."