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quinta-feira, 20 de setembro de 2012

Ao Vivo do Espaço Sideral: ensaiando "Your Blue Room" para seu 'debut' ao vivo

Revista Rolling Stone - Edição 55 - Abril de 2011

Ao Vivo do Espaço Sideral
Por trás dos segredos da turnê 360º, a maior já feita pelo U2 – e por qualquer outra banda na história - Parte 01

Uma espaçonave irlandesa pousou no estádio de futebol americano de Chicago e seu piloto está postado sob um céu sem estrelas, vociferando ordens malucas em um microfone: "Tire a voz dos astronautas", diz Bono, e seu sotaque ecoa pelos 61 mil assentos vazios. "E, se possível, tire a Sinéad do primeiro verso. (...) A explosão sônica precisa ir baixando três vezes mais rápido - não é uma coisa sutil, é uma mudança brusca." Faltam menos de 24 horas para o início da primeira turnê em estádios do U2 nos Estados Unidos desde 1997 - e, de acordo com o cantor do grupo, é o momento perfeito para destruir um pedaço do show. Ele está com fixação em uma música obscura, "Your Blue Room", uma faixa lânguida e cheia de atmosfera do álbum Original Soundtracks 1, de 1995, uma colaboração com Brian Eno assinada como Passengers. O U2 nunca a tocou ao vivo, mas, nessa noite, vai tentar transformar a faixa em um número elaborado, com vocais de Sinéad O'Connor e vídeo e áudio gravado a bordo da Estação Espacial Internacional. "Nós temos sorte de eles não estarem fazendo isso ao vivo, direto do espaço", diz o empresário do grupo, Paul McGuinness, observando enquanto a iniciativa caríssima se desdobra perante seus olhos.

O cenário verdadeiro já é bem exótico: uma catedral de ficção científica com quatro pernas de metal - o maior palco da história do rock, grande o bastante para ser visto de aviões que vão pousar na cidade. É quase uma coisa viva, com rampas móveis, jatos constantes de fumaça e luzes suspensas rotativas que valem por uma constelação. Até a tela de vídeo faz seus truques, esticando e encolhendo igual a uma mola - quando Bono pede para que seja retraída, ela o faz na mesma hora, com um barulho que parece o zumbido de mil abelhas. Até agora o último ensaio estava indo bem: a banda já tinha dado conta da primeira metade do set de duas horas, tocando para assentos vazios. O show - que já foi polido em 24 datas na Europa - começava com quatro músicas do álbum mais recente da banda, No Line On the Horizon, antes de mergulhar no catálogo antigo. Mas "Your Blue Room" é uma confusão, com a essência da canção enterrada na conversa dos astronautas e outros efeitos sonoros. Um momento que deveria ser emocionante simplesmente não está funcionando - um astronauta belga chamado Frank De Winne aparece na enorme tela de vídeo cilíndrica e recita um verso enquanto flutua em gravidade zero. "Não foi uma experiência agradável", Bono diz e logo muda o rumo do ensaio, repetindo a música vez após outra. Os companheiros de banda e a equipe de produção já tinham gastado uma hora com a música na noite anterior, e percebem que aquilo ainda iria demorar bastante quando o vocalista pede que lhe tragam um café. Enquanto estão reformatando os efeitos sonoros e o vídeo, Bono compõe um verso novo, ali mesmo, para a música de 14 anos de idade, improvisando letras e melodias cada vez que a canção é repassada.
O caráter incansável de Bono ajudou o U2 a chegar tão longe - ao mesmo tempo que levou o grupo até a beira de um ou dois penhascos do tamanho da desastrosa turnê PopMart pelo caminho. "Bono tem de ser o Papai Noel de 70 mil pessoas todas as noites", diz Willie Williams, diretor dos shows da banda há muito tempo. "Então, é absolutamente justo que ele tome as decisões." O resto da banda acompanha a tenacidade do vocalista com graus variados de bom humor. Depois de terminarem uma longa conferência no palco com Williams, o baterista Larry Mullen Jr. solta: "Se estiver muito fácil, pode dificultar".
Em jogo está o maior show de rock de todos os tempos - e o U2 parece totalmente à vontade por trabalhar nessa escala. O palco monstruoso é o local de trabalho da banda, tão normal para eles quanto um cubículo de escritório. Mas não há como negar: 33 anos depois que quatro adolescentes de Dublin se juntaram na cozinha dos pais de Mullen, eles chegaram ao auge. "Na verdade, estamos no limite, no limite absoluto, se considerarmos a economia e a viabilidade do transporte", diz The Edge. "Nós realmente somos tão grandes quanto poderíamos ser." O tamanho da turnê, em alguns aspectos, é exatamente o ponto: um argumento a favor do valor do megaestrelato do rock em si. Em uma cultura tão dividida musicalmente e politicamente, o U2 se oferece como uma coisa a respeito da qual as pessoas podem concordar. Mas "Your Blue Room" está longe de ser um sucesso, e não é exatamente a ideia que qualquer pessoa faz de rock de estádio - em cada versão subsequente, a banda tenta fazer com que a música fique mais tranquila, mais sedutora. "É uma coisa delicada", Bono diz. "O problema é que a música pode afundar uma parte inteira do set se não funcionar." Ele está pronto para fazer uma aposta e tocá-la na primeira noite, mas o resto da banda quer passar o número para a segunda noite em Chicago. (A música acaba estreando no segundo show - Bono, que observou o público com atenção, disse ter visto expressões "arrebatadas e um pouco perplexas". Mais recentemente, a faixa foi cortada do repertório.)
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