Um dia frio de dezembro, aterrisar no aeroporto JFK, neve no chão, rádio BLS tocando Billie Holiday, Nova Iorque com muitas luzes como uma árvore de natal, esta noite a cidade pertence à mim.
Entenda agora o porque destas citações presentes na canção "Angel Of Harlem", de 1988:
Do livro U2 BY U2:
Paul Mcguinness: A idéia de fazer uma turnê preliminar na América em 1980 surgiu mesmo antes do primeiro álbum ter saído, só para todos irem pensando na América e viver isso antes de ter qualquer pressão. Durante a gravação de Boy fui à Nova York pela primeira vez para encontrar com Frank Barsalona. O maior e mais importante agente na América nos anos 70. Foi uma aventura um tanto esperançosa da minha parte. No entanto, meu pai morreu repentinamente, no dia após a minha chegada. Por isso, tive que dar meia volta e voltar à Dublin sem completar a minha missão. A perda de um pai é sem duvida algo comovedor e que transforma com completo a vida de uma pessoa. Todos da banda estiveram presentes no funeral e eu fiquei muito agradecido pelo apoio deles. O Bono e o Larry já tinham passado por uma situação de perda idêntica. A mortalidade parece ser um dos elementos que sustenta o U2 e talvez tenha ajudado a cimentar a relação entre todos. Algumas semanas depois, quando voltei para Nova York, o Frank Barsalona não teve outra opção senão me encontrar, devido às circunstâncias trágicas que cancelaram o nosso último encontro. Na verdade, nos tornamos bons amigos e a relação profissional com ele e com a Bárbara Skydel, o seu braço direito, foi a base da erupção do U2 na América como banda ao vivo. O mesmo se aplica ao nosso agente, Ian Flooks, no resto do mundo.
Adam: O Frank Barsalona era um caso exemplar. Nos contava histórias sobre os Beatles, The Who e o Led Zeppelin, pois já tinha sido agente deles. Nós achávamos que ele era o grande conhecedor da América.
Paul: Nos anos 60, ele tinha sido agente dos Beatles na GAC (General Artists Corporation) e mais tarde, formou a sua própria agência, a Premier Talent. Foi o agente da invasão britânica e lançou todas as grandes bandas de rock. Estabeleceu uma rede de promotores por toda a América: Bill Graham em São Francisco, Don Law em Boston, Barry Fey em Denver, Michael Cohl em Toronto, Arnie Granat e Jerry Michaelson em Chicago. Essa rede de promotores teria que arrumar shows para as bandas do Frank. O Frank ligava e dizia: “Tenho uma nova banda chamada U2. Quero que você Don, arrume um show para eles no Paradise” – que era um lugar pequeno, um clube em Boston - e os promotores acompanhavam a banda à medida que ela ia alcançando diferentes níveis de capacidade. E foi exatamente isso que fizemos desde 1980 até a turnê Zoo Tv, nos anos 90. E tudo começou com uma pequena turnê pelo nordeste em uma van.
Bono: O Paul enchia nossas cabeças com a América. Ele já tinha percebido que as bandas de rock, no seu sentido comum – Os Beatles, os Stones e The Who já tinham passado de moda na Europa, mas continuavam sendo adoradas na América. Nós não criamos singles virados para o pop e o Paul acreditava que haveria maior probabilidade de passarem a nossa música na rádio da universidade nos Estados Unidos do que na rádio 1 do Reino Unido. Daí enviou algumas cópias do nosso álbum para estações de rádio universitárias americanas e eles gostaram do trabalho. Foi graças a isso que nos apresentamos na América.
Edge: Os irlandeses estão na orla da Europa e há uma ligação sentimental muito forte com a América por ter servido de abrigo às inúmeras ondas de imigração saídas da Irlanda. Era como a terra prometida. Por isso, indo lá era uma forma de explorar esse lugar mítico. Mas é também a cultura dominante da comunicação social mundial, com todos os programas de televisão, filmes e música, e a minha primeira impressão foi de que é tudo exatamente como vemos na televisão. Cheguei a suspeitar que a América dos programas e filmes era uma espécie de exagero. Mas, ao andar pelas ruas, é como se estivéssemos andando por entre inúmeros programas de televisão. Está tudo lá. Fiquei fascinado com os diferentes sotaques, com a arquitetura e até mesmo com coisas banais como o café.
Bono: Escrevi uma música sobre isso: "Angel Of Harlem". Aterrissamos no aeroporto JFK e foram nos buscar de limusine. Nunca tínhamos entrado em uma e com o ruído ainda do punk rock presente nos nossos ouvidos, sentíamos uma espécie de satisfação comprometida ao chegar. E íamos sempre com um sorriso nos lábios, por achar tudo aquilo tão divertido. Atravessamos a ponte Triborough e observamos o perfil de Manhattan. O motorista da limusine era negro e tinha sintonizado a WBLS, uma estação de negros. Estava tocando uma música do Billie Holiday. E ali estava ela, a cidade das luzes ofuscantes e corações de néon. No céu passavam propagandas de bandas como nós, tal como em Londres no ano anterior. E estava nevando. Paramos na porta do Gramercy Park Hotel e entramos todos.