Bono é uma das várias estrelas e políticos de destaque que participam de uma série de documentários da BBC sobre o Live Aid, que celebra seu 40º aniversário.
Bono revelou que, embora o Live Aid possa ter eventualmente levado-o a pagar uma dívida de um bilhão de dólares na África, ele sempre fica envergonhado por causa de uma coisa: seu então gritante mullet.
"Não consigo olhar para trás, para este momento, com os dois olhos, porque foi o dia de um cabelo muito ruim. Tipo, honestamente, um dos momentos mais famosos da sua vida e do seu ativismo, você tem um mullet. Não é bom, simplesmente não é bom. Então, não consigo olhar para aquela porcaria", ele sorri.
U2 e Queen ainda são os artistas mais comentados de Wembley naquele dia.
O U2 tocou uma versão estendida de "Bad" em Wembley, com Bono pulando no meio da multidão e, em seguida, puxando uma jovem mulher nas primeiras filas lotadas e a abraçando.
"Por mais que eu esteja atento procurando alguém no meio da multidão, também estou muito consciente de que esta é uma transmissão de TV, não apenas um show", ele lembra.
"Acabei não tocando o hit "Pride (In The Name Of Love)" porque o cantor se meteu no meio da multidão. A banda queria me demitir por causa disso. Eu simplesmente sabia que fazíamos parte de algo... Isso deu início a uma jornada para todos nós, do que você poderia chamar de caridade para o que você poderia chamar de justiça".
A nata do pop e rock britânico e irlandês havia sido reunida em 1984 por Bob Geldof e Midge Ure para lançar o single Band Aid.
"Havia egos na sala, não muitas mulheres", Bono relembra ironicamente.
"Fiquei um pouco desconfortável. Dá para perceber isso porque estou tímido, o que já é um sinal claro. E aí o Bob, bem relaxado, me passa a letra "Graças a Deus foram eles, e não você, meu amigo", e eu disse 'você tem certeza de que é isso que você quer dizer?'", Bono lembra.
Bono diz maliciosamente a Geldof durante a gravação da música: "É um hino realmente, não é? Bob, você chegou lá no final", ao que Geldof retruca com uma risada irônica: "Vá se foder".
O single em auxílio ao combate à fome na África vendeu mais de um milhão de cópias no Reino Unido, tornando-se o disco mais vendido de todos os tempos na Grã-Bretanha.
"Eu sou irlandês, Bob Geldof é irlandês. Temos uma memória popular da fome. Eu disse: 'OK, tentarei ser digno dessa oração cruel'", afirma Bono.
"Nós pensamos como muitas outras pessoas: "Esta é uma crise humanitária, e o problema não é africano ou etíope, é europeu e americano, com uma pequena distribuição podemos resolver o problema". Isso não é verdade. Foi um ato de caridade magistral".
O Band Aid e o Live Aid levaram Bono e Geldof a se unirem para encontrar líderes mundiais em breve, para que eles não apenas aliviassem a fome na África, mas também quitassem dívidas e ajudassem na situação da AIDS/HIV naquele país.
George W. Bush lembra-se de ter conhecido a dupla quando era presidente.
"Ele e Bono entraram, e Bono estava pelo menos um pouco apresentável, Geldof parecia ter saído das cavernas", ele ri.
Antes da reunião, um assessor perguntou a ele: "Você sabe quem é Bono?" e ele disse: "Sim, ele se casou com Cher".
"Eu me virei e olhei para o rosto dele e não consegui perceber se ele estava brincando, e eu disse, 'não, esse é Sonny Bono, que está morto'", comentou o assessor.
Bush foi pego em posição de impedimento por Bono durante seu primeiro encontro.
"Eis que entra o grande astro Bono. Ele me surpreendeu ao me dar uma Bíblia. Não acho que isso foi uma maneira de me fazer gostar dele, foi uma maneira de ele compartilhar um pouco do seu ser. Ele defendeu a ideia de que as pessoas estavam morrendo de AIDS. Eu fiz campanha e disse às pessoas que um princípio norteador da minha administração era que toda vida é preciosa e que todos somos filhos de Deus".
Bono revela por que deu uma Bíblia a Bush.
"Eu sabia que ele era um homem de fé e pensei que ele poderia gostar desta antiga bíblia irlandesa", lembra Bono.
"Perguntei a George Bush: 'Existe uma hierarquia para o pecado?'. Ele me deu a melhor resposta que alguém já deu: 'Ah, o pecado da omissão'. O pecado da omissão (quando as pessoas estão ocupadas demais para pensar nos outros)".
Geldof diz sobre Bono: "Bono e eu somos muito amigos e muito próximos. Naquela época, ele já era um mega astro global, eu não", ressalta. "Ele quer dar ao mundo uma casa grande e quer desferir um golpe levando a luz do lugar".
A perseverança da dupla levou ao cancelamento de bilhões de dólares em dívidas de nações africanas pelos países do G8 e europeus.
Bono também lembra como o U2 e Paul McCartney abriram o Live 8 em 2005.
"Pouco antes do início do Live 8, o U2, estávamos no camarim. Fechamos a porta e fizemos uma oração. Nosso empresário, Denis Sheehan, que Deus o tenha, sabe que ninguém pode vir, é um momento privado", lembra Bono, acrescentando que ouviram batidas na porta.
"Ninguém atendeu a porta. Terminamos a oração. Perguntei ao Denis: 'O que foi aquilo na porta?'. Ele respondeu: 'Ah, era Sir Paul McCartney'. Eu disse: 'Paul McCartney?'. Saí correndo e gritei: 'Paul!'. Ele perguntou: 'O que você estava fazendo?'. Eu disse: 'A gente só tem um momento de oração, sabe? Um daqueles momentos de oração?'. 'Por que você não me convidou? Se tivesse me convidado, eu adoraria participar... façam de novo, comigo'.
Os quatro membros da banda e McCartney então se reuniram do lado de fora do camarim e fizeram uma oração juntos.
"Foi a oração mais poética, e então subimos no palco", reflete Bono.
