Ao lembrar do que o fez escrever a canção "Mothers Of The Disappeared", Bono reviveu o dia em que testemunhou o terror em El Salvador, nos anos 80, quando o governo ditatorial apoiado pelos Estados Unidos eliminava as vozes contrárias.
"As pessoas estavam desaparecendo. Indo de carro até um vilarejo, pouco depois de voarmos para San Salvador, passamos por um corpo na beira da estrada que acabara de ser jogado para fora de uma picape em alta velocidade. Paramos e vimos um bilhete preso no peito do morto: 'Isso é o que acontece com quem tenta fazer a revolução'."
Da América Central para a África, Bono foi ver de perto a fome dos etíopes e fazer o que estava a seu alcance para, um dia, contar: "Estamos aqui para mostrar solidariedade ao povo deste país e para entender melhor a questão mais importante, embora seja um clichê, que o mundo já enfrentou.
Uma pergunta que venho tentando responder em minha vida desde então: por que há fome em um mundo de abundância? Como as pessoas podem carecer de comida em um mundo em que há montanhas de açúcar e lagos de laticínios? E o que pode ser feito?", ele escreveu em 'Surrender', sua autobiografia.
Os Estados Unidos eram um alvo de Bono quando o clássico álbum 'The Joshua Tree', de 1987, foi lançado. "Não havia dúvidas de que estávamos atrás das barricadas. No início dos anos 1990, eu satirizava o governo dos EUA todas as noites".
'Surrender', o nome do livro, significa "render-se" – e Bono explica seu sentido. "Preciso ficar mais calado e me render à minha banda. Isso tem sido tudo o que estou tentando fazer com a minha vida: me render à minha esposa, ao nosso Criador. Estas não são coisas que vêm fáceis para mim".
Mas, ele diz, não se trata de uma rendição covarde. "Quando eu digo "render-se", não quero dizer fazer as pazes com o mundo. Não estou pronto para fazer as pazes com o mundo. Estou tentando fazer as pazes comigo mesmo. O mundo é um lugar profundamente injusto, e estou pronto para ruir. Estou mantendo meus punhos cerrados para isso".
Esse é o Bono de 'Surrender', um pacifista sensível à fome na África, às guerras santas do Oriente Médio, à Teologia da Libertação e até ao terrorismo político na América Latina.